quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Varinas de Lisboa - Memórias da Cidade no trajecto plástico de Luis Dourdil

Foi no século XIX que começaram os primeiros movimentos migratórios rumo a Lisboa, com o objectivo de encontrarem melhores condições de vida e oportunidades de emprego. As varinas, tradicionalmente conhecidas como “mulheres do peixe”, instalaram-se nos bairros típicos de Lisboa – Alfama, Bica e, sobretudo Madragoa – junto às ribeirinhas ricas em sardinha e sável.


Dourdil visitava com assiduidade a lota Ribeira onde desenhava estas figuras icónicas de Lisboa que 
imortalizou nas suas obras.

 Um dos temas mais abordados pelo pintor nos anos 40 e 50 foram os Bairros lisboetas, trabalhadores, gente anónima do meio urbano na sua azafama.
Crayon S/ Papel 80 X 57" Varinas de Lisboa" de Luís Dourdil Colecção C.M.L.




De pé descalço e canastra à cabeça: Olha a bela da sardinha!


Ao longo da exposição, o retrato destas personagens é feito através do fado, de fotografias, trajes, pinturas, esculturas, literatura, artigos de imprensa, postais e testemunhos na primeira pessoa, que são apresentados em vídeo. Num deles, uma antiga varina, senhora de cabelo branco, óculos e blusa preta conta como “não podia andar descalça e todos os dias ia parar à esquadra”. Isto porque, e como explica um texto gravado na parede, a partir de 1928 foi criada uma lei que obrigava tanto varinas como varinos a andarem calçados por questões de higiene. No entanto, a maioria fugia à lei, pois não achava prático trabalhar com água pelos joelhos e, ao mesmo tempo, estar de chinelo no pé.

As varinas eram mães, mulheres trabalhadoras, resistentes e praticamente indomáveis. Nos anos 80 a 90 acabaram por desaparecer, passando das ruas para as bancas dos mercados, mas são ainda recordadas como símbolo e ícone da cidade de Lisboa. Com a evolução das tecnologias de congelação e refrigeração do pescado, a abertura das grandes superfícies comerciais e o melhoramento nos serviços de distribuição, tornou-se difícil resistir. Na altura, a maior parte delas virou-se para a costura ou para as limpezas.

Apesar da “extinção”, a figura da varina prevalece cristalizada, principalmente graças às marchas populares. Na arte, e como mostra a selecção apresentada pelo Museu de Lisboa, foram a inspiração para diversos autores, como;
 Almada Negreiros, João Abel Manta, Luís Dourdil, Alice Jorge, Stuart Carvalhais ou Jorge Barrada
Aliás, mesmo o físico Albert Einstein admitiu ficar impressionado com estas mulheres, como o descreveu no diário onde relatou a sua viagem por Lisboa.

Maria Beatriz Raposo
Varinas na lota, Lisboa 1912. Negativo de gelatina e prata sobre vidro. Fotógrafo, Joshua Benoliel - Arquivo Municipal de Lisboa




"Eram de longe.

Eram de longe.
Do mar traziam
o que é do mar: doçura
e ardor nos olhos fatigados."
Eugénio de Andrade 





Lisboa 
Esta névoa sobre a cidade, o rio,as gaivotas doutros dias, barcos, gente apressada ou com o tempo todo para perder,esta névoa onde começa a luz de Lisboa,rosa e limão sobre o Tejo, esta luz de água,nada mais quero de degrau em degrau.


Eugénio de Andrade






" VARINAS" Óleo de Luis Dourdil de 1952





Os bairros de Lisboa são objecto da sua pintura que se prende às sombras, aos grupos de trabalho ou à deambulação desempregada, nunca se fixa no recorte pitoresco. O mundo dos humanos constitui o seu apelo.

Nos anos 40, visita várias cidades da Europa e a sua visão emerge, plena de síntese, de acordo coma sua própria concepção plástica.

Nos anos 50, época da maturidade, o pintor capta, definitivamente, os alicerces estruturais e estéticos do seu edifício plástico.





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